História do Teatro em Portugal — Cronologias
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Gil Vicente

Entre 1502 e 1536, Gil Vicente faz na corte de Portugal o melhor e mais avançado teatro da Europa cristã do seu tempo. Para um mundo novo, transforma de raiz um modelo que o tempo produzira. O autor (talvez ourives de primeiro ofício) terá trabalhado no teatro dos trinta e dois aos sessenta e seis anos da vida. No princípio do período manuelino, o trabalho de Gil Vicente foi instigado, apoiado e pago pela rainha Lianor, irmã de Manuel I e viúva de João II. Morto o rei Manuel em 1521, sucede-lhe o filho João III, que, como o pai e a tia, manda fazer teatro no paço. O primeiro terço do século XVI é o tempo de apogeu da corte de Portugal como centro de um movimento de expansão que abrange a África, a Índia e o Brasil. Lisboa torna-se um lugar de luxo e arte que só tem rival na corte do Papa. O teatro recorta-se como prática limitada e como mercadoria. Uns ordenam e outros representam. Num sistema novo de divisão do trabalho artístico, emergem ofícios em busca de legitimação: autores e actores. Compradores encomendam produtos com prazos e medidas, paga-se a quem faz e o teatro tenta equilibrar oferta e procura de arte. No teatro de Gil Vicente, auto é um nome comum que designa cerca de cinquenta produções teatrais: moralidades, farsas, comédias. Cada auto é a apresentação de um programa para acção de corpos. Existe como monumento especioso em festas religiosas e seculares. Sabe dos autos anteriores, da corte onde se faz, do mundo. Mas não é só memória acumulada. É movimento e nova invenção. O trabalho de Gil Vicente implica imaginar um projecto de auto, escolher e montar materiais, escrever e ensinar versos novos, achar um modo para vestir os actores, escolher ou fabricar o aparato, conhecer o espaço em que vai trabalhar, com entradas, saídas e mais formas. É preciso também fazer ou escolher as músicas. O conjunto dos autos forma uma série homogénea de acções textuais de corpos vivos: autor, actores e mais quem vê. O autor é fundador e proponente. Os actores são corpos que mexem no espaço e produzem sequências de imagens e sons. Gil Vicente é autor e actor. Desde o primeiro auto, dá-se a ver e a ouvir, expondo o próprio corpo feito texto. Não se sabe quem são os outros actores. Aliás, de todo este trabalho de teatro ficou pouca memória. Nenhum pintor, ao que parece, representou um momento a fazer-se. Quase ninguém contou por escrito como foi. Diogo do Couto, Garcia e André de Resende, o cardeal Aleandro falaram da sua realidade, mas pouco contaram. De qualquer modo, por muita memória que tivesse ficado, o que se poderia sempre dizer dos autos de Gil Vicente é que houve muitos e não há nenhum. São acções perdidas porque o trabalho de teatro não fica todo na memória digital. Quase tudo o que hoje se sabe do teatro de Gil Vicente vem da Copilaçam de todalas obras, impressa em 1562 e organizada pelos filhos Luís e Paula, e de alguns folhetos anteriores, impressos em vida e à vista do autor, por vezes com informação próxima dos autos: Barca do Inferno, Maria Parda, Dom Duardos, Inês Pereira. Os objectos artísticos de Gil Vicente produziram escritos, espectáculos, desenhos, músicas. Foram feitas bibliografias em 1942 por Castro e Azevedo (Lisboa: Biblioteca Nacional) e em 1980 [e 1997] por Constantine Stathatos (Londres: Grant & Cutler). O manual de base é ainda o livro de Braamcamp Freire Vida e Obras de Gil Vicente «Trovador, Mestre da Balança», escrito em 1919. Convém que o leitor conheça a Copilaçam de 1562 e os folhetos, ao menos por reproduções analógicas. 

GIL VICENTE – OS Géneros

  

MONÓLOGOS

 O teatro de Gil Vicente começa por celebrar na noite de 7 de Junho de 1502 o nascimento do que viria a ser o futuro rei D. João III. Trata-se do Monólogo do Vaqueiro ou Auto da Visitação que, tal como no livro de 1562, “se põe aqui primeiramente, por ser a primeira cousa que o autor fez”. Durante a carreira teatral de mais de trinta anos, Gil Vicente teve ainda oportunidade de dar corpo e voz singulares a ações teatrais de que foi intérprete único, como a Pregação de Abrantes, predicada ao nascimento do infante D. Luís, em 1506. Outros textos da sua autoria, de géneros literários diversos, alimentaram a interpretação individual de atores e atrizes ao longo dos séculos xx e xxi: a paráfrase do Salmo Miserere mei Deus, a Carta que escreveu de Santarém a D. João III sobre os efeitos do tremor de terra em fevereiro de 1531 e o muito visitado Pranto de Maria Parda, que tem dado azo a assíduas recriações.

 

Carta de Santarém

 Carta escrita de Santarém ao rei D. João III, em 1531.

Em consequência do tremor de terra de 26 de Janeiro de 1531, os frades de Santarém atemorizaram a população afirmando que o fenómeno fora manifestação da ira de Deus pelos pecados que se cometiam em Portugal e que no mês seguinte iria ocorrer outro terramoto, acompanhado de um maremoto ainda maior.

Gil Vicente reúne os frades do Convento de São Francisco e profere uma lição sobre cada uma das afirmações dos frades. Começa por evidenciar que tudo tem o seu contrário em perfeita concordância, e que nada perdura, dando umas coisas fim a outras. É nesta ordem natural do mundo que se inscreve o tremor de terra e não na ordem do milagre, esses, sim, dignos de registo. Termina com uma admoestação contra a soberba da previsão do futuro, que pertence exclusivamente a Deus.

Desta sua iniciativa Gil Vicente dá conta ao rei numa carta em que anuncia um relato mais pormenorizado do acontecido. Segundo conta, os frades acataram a lição e replicaram-na nos sermões seguintes, tranquilizando os cristãos-novos que se sentiram ameaçados.

  

Maria Parda

 Escrito em 1522 (1521?).

Texto constituído por duas partes, um pranto e um testamento. Ao ver algumas tabernas de Lisboa sem vinho e outras a vendê-lo muito caro, Maria Parda chora o seu desaparecimento ou escassez. Deambulando pela cidade de Lisboa, suplica a vários taberneiros que lhe fiem o vinho de que necessita para a sua sobrevivência. Quando todos lhe negam o pedido, decide ditar o seu testamento, fazendo-o em paródia dos legítimos: encomenda a alma a Noé, o primeiro bêbedo da Bíblia, institui testamenteira uma companheira sua, também bêbeda, determina que as tochas que acompanharão o corpo sejam de cepas de vinha, que lhe rezem missas apenas os clérigos de terras de bom vinho, e o cortejo fúnebre há-de passar pelas hortas das tabernas. Por fim, deixa os seus bens a quem se embebedar e manda erguer um hospital para acolher somente quem vier de terras de bom vinho.

  

Miserere

Tradução e paráfrase do salmo 51 da Bíblia, inspiradas na tradução de Girolamo Savonarola, que circulou por toda a Europa. Nas estrofes que antecedem a paráfrase, Gil Vicente glosa o preâmbulo que Savonarola apõe à sua tradução do salmo. Desenvolve o tema de uma consciência atormentada pela culpa, uma alma que busca a salvação em Deus, depois de abandonada pelo cosmos.

A interpelação de Deus faz-se com a identificação divina com a própria misericórdia, pronta a socorrer o pecador, que confessa e lamenta as suas culpas. A persistência na súplica pela purificação/redenção espera ser recompensada pela clemência, oferecendo como retribuição o sacrifício.

  

Pregação de Abrantes

 Representado em Abrantes, em 1507, à rainha D. Leonor no nascimento do infante D. Luís, filho do rei D. Manuel I e da rainha D. Maria.

Sob a capa da loucura, Gil Vicente, homem leigo, prega um sermão seguindo todas as regras da retórica, desenvolvendo o tema Non volo, volo et deficior, que o próprio traduz para castelhano como No quiero, quiero y es por demás. O desenvolvimento do tema faz-se em três partes. Em primeiro lugar enuncia o que não quer: não quer discutir questões de Teologia nem citar casos da Antiguidade Clássica, ou seja, especular. A segunda parte trata do que quer dizer: ninguém vive de acordo com a fé e todos seguem as artes do diabo, exemplificando com a comparação do mundo a um moribundo e descrevendo os nove sinais da agonia. A terceira e última parte é sobre o que se torna inútil ou é escusado: entre outros, enumera alguns exemplos triviais como o de uma boa semente lançada a terra estéril, e outros doutrinais, como inculcar a doutrina num mau cristão. Por fim, afirma que é escusado pregar a verdade porque ninguém a quer ouvir; e assim o pregador conclui que o seu próprio sermão foi inútil.

  

Visitação

 Representado no Paço da Alcáçova de Lisboa, em 7 de Junho de 1502 para celebrar o nascimento do príncipe D. João, filho de D. Manuel e de D. Maria.

Um vaqueiro entra a custo na câmara de estado onde, na véspera, a rainha parira o futuro rei D. João III. Maravilha-se com a riqueza do espaço e elogia a família real, incluindo os Reis Católicos de Espanha, avós maternos do príncipe. No final, faz entrar um grupo de pastores que trazem oferendas para a mãe e para o recém nascido.

  

DEVOÇÃO

 As moralidades, designação que Gil Vicente utiliza para as suas obras de devoção, congregam géneros diversos como as éclogas pastoris, as próprias moralidades, os mistérios e os milagres que organizavam teatro anterior de que o autor também é herdeiro. Encenam os grandes temas espirituais sobres os quais o Homem se interroga ao longo da vida. Tendo como motor o calendário litúrgico, o teatro de inspiração religiosa de Gil Vicente centra-se na questão da salvação humana, insistindo no livre-arbítrio e na esperança, de que são exemplos as Barcas, o Breve Sumário da História de Deus e o Auto da Alma, cuja oportunidade permite ainda apresentá-lo fora dos ciclos rituais. À medida que avança no seu percurso teatral, Gil Vicente integra elementos de outros géneros teatrais que contaminam o discurso hierático, sobretudo o satírico das farsas, e as desavenças das comédias, como acontece no Auto Pastoril Português ou no Auto da Feira.

 

 Alma

  Representado em 1508 (?) à rainha viúva D. Leonor, e ao rei D. Manuel I, em Lisboa.

 Trata-se da viagem alegórica de uma alma pelo caminho da vida. Durante o percurso será tentada pelo diabo a levar uma vida de luxo e de prazer, e aconselhada por um anjo a assumir uma vida honesta e austera, tendo ela própria que escolher entre a perdição e a salvação. Depois de sucumbir à tentação, a alma reconhece que pecou e acolhe-se a uma estalagem – a Igreja – onde é recebida pelos seus quatro doutores que lhe oferecem uma refeição mística, constituída pela contemplação das insígnias da paixão de Cristo. Reconfortada, a alma despoja-se dos ornamentos profanos, e reza. No final, todos se dirigem em adoração a um altar que representa o sepulcro de Cristo.

 

 Barca do Inferno

 Conhecem-se duas versões deste texto. Numa diz-se 1ue foi representado em 1517 para consolo da rainha D. Maria, mulher de D. Manuel, pouco antes de morrer. A outra informa que foi feito para a rainha D. Leonor e representado ao mesmo rei, seu irmão.

 Num braço de rio duas barcas aguardam passageiros para o além: uma, com destino ao Inferno, é capitaneada por um diabo, a outra, com destino ao Paraíso, é comandada por um anjo. Os viajantes são representantes da população urbana: um fidalgo, sapateiro, onzeneiro, frade, que leva uma jovem pela mão, procurador, corregedor, alcoviteira, judeu, um enforcado, um parvo. Toos se dirigem em primeiro lugar à barca da glória, convencidos de que será esse o seu destino. No entanto o Anjo nega-lhes o acesso e acabam por embarcar para o Inferno, depois de o Diabo lhes ter apontado os pecados que cometeram em vida, à excepção do parvo, que fica na margem do rio à espera de ter lugar na barca do Paraíso. No final, as almas de quatro cavaleiros, que perderam a vida na luta contra os infiéis, vão directamente para o céu.

  

[Barca do ] Purgatório

 Representada no Natal de 1518, na igreja do Hospital de Todos os Santos, em Lisboa,

O mesmo cenário da Barca do Inferno: um rio com duas barcas, uma que conduz as almas ao Inferno, outras que as conduz ao Paraíso, um diabo e um Anjo na proa das respectivas barcas. Neste ano, os passageiros são do mundo rural: um lavrador, uma regateira de produtos campestres, um pastor, uma moça pastora, um menino. Apenas este último embarca para o Paraíso. Todos os outros terão de expiar os pecados ao longo da margem do rio, o Purgatório, e só depois embarcarão. O perdão conferido pela noite de Natal, que impede a navegação da barca do Inferno, não abrange, no entanto, a última personagem a desfilar, um taful, que tem entrada directa na barca do Inferno, sem hipótese de salvação.

  

Barca da Glória

 Representado na igreja de Almeirim na Pascoa 1519, ao rei D. Manuel.

O auto desenrola-se no mesmo cenário de Barca do Inferno e de Purgatório: a margem de um rio com duas barcas que passam as almas para o além: uma para a Glória, comandada por um Anjo, a outra para o Inferno, pilotada por um Diabo. Desta vez embarcam as altas dignidades: Papa, Cardeal, Arcebispo, Bispo, Emperador, Rei, Duque e Conde, que agora são conduzidos ao cais pela Morte. Todos são condenados ao Inferno. No entanto, antes de embarcar cada um deles se dirige a Deus em oração de arrependimento, o que motiva a remissão dos pecados outorgada pela paixão de Cristo, que surge ressuscitado e reparte os remos pelos passageiros.

  

Breve Sumário da História de Deos

 Representado em Almeirim ao rei D. João III e à rainha D. Catarina, no Natal de 1527.

Um Anjo anuncia que se irá representar a história do Mundo desde a Criação até à Ressurreição de Cristo. São encenados somente alguns episódios, sendo outros apenas narrados. Em primeiro lugar assiste-se aos planos de Lúcifer para tentar Eva, através de Satanás. em figura de cobra. Entram o Tempo e o Mundo que assistem ao arrependimento não atendido de Adão e Eva e à aparição da Morte, consequência do primeiro pecado mortal, que os conduz ao Limbo. Surge Abel, que cumprirá igualmente o destino dos pais, entrando no Limbo onde é castigado. O episódio seguinte é o de Job, lamentando-se da vida, a quem Satanás cobre de lepra, e o prende no Limbo, terminando o ciclo da Lei da Natureza. O número seguinte é protagonizado por quatro profetas, Abraão, Moisés, David e Isaías, que representam a Lei da Escritura. Depois de cada um sintetizar as suas atribuições bíblicas, todos se dirigem para o Limbo. Por fim, aparecem os exemplos da lei da Graça. Primeiro João Baptista, que pregoa a vinda de Cristo, e que tendo cumprido já a sua missão na terra se dirige para o Limbo. Todos os prisioneiros entoam um romance esperançoso na salvação. Entra Cristo que, depois de resistir às tentações de Satanás, se deixa morrer para logo ressuscitar e libertar todos os prisioneiros do Limbo.

 

 Cananea

 Representado no Mosteiro de Odivelas, em 1834, a pedido da abadessa, D. Violante Cabral.

Em figura de pastoras, entram as três Leis – da Natureza, da Escritura e da Graça – cada uma explicando o sentido da sua alegoria. Surgem Satanás e Belzebu, que hão-de acompanhar o desenrolar da peça, comentando algumas acções. Vem Cristo acompanhado de seis apóstolos a quem ensina a oração e significado do «Pai nosso». Segue-se a história da mulher cananeia, uma estrangeira em terras judaicas, cuja filha se encontra possessa de um demónio. Implora a Cristo que a salve, mas este recusa, declarando-se apenas ao serviço do povo de Israel. A mulher insiste na súplica em oração de humildade, conseguindo convencer Cristo, que acaba por premiar a fé e perseverança daquela mulher.

  

Diálogo sobre a ressurreição de Cristo

 É o diálogo final, e quase a modo de epílogo, do Breve Sumário da História de Deos. É protagonizado por três rabinos que questionam a natureza messiânica de Jesus e discutem a veracidade da Ressurreição, narrada pelos centúrios que guardavam o túmulo de Cristo.

  

Fé

 Representado na Igreja de Almeirim no Natal de 1510 ao rei D. Manuel.

Dois pastores assistem à missa maravilhados com a magnificência de toda a cerimónia, desde os objectos até aos participantes, lamento ando não alcançar o sentido de tudo aquilo de vêem. Como por milagre surge a alegoria da Fé que lhes explica o significado geral do culto e da fé, detendo-se em especial na interpretação do Cristo crucificado, comentando, em seguida, a pobreza do presépio, que descreve.

  

Feira

 Representado em Lisboa ao rei D. João III, às matinas do Natal de 1527.

Na noite de Natal, Mercúrio anuncia a realização de uma feira destinada ao comércio das virtudes, a cargo do Tempo e de um Serafim, e dos vícios, a cargo do diabo. Desfila uma série de compradores que vão desde Roma, alegoria do Papado, que pretende comprar paz, verdade e fé, que lhe faltam, até dois casais desavindos, querendo os maridos trocar de mulher um com o outro, mas acabando por ficar cada um com a sua. Entram as respectivas mulheres, convencidas de que se encontram numa feira rústica de adornos e de produtos campestres. Quando se apercebem da natureza da feira, desistem de a visitar. No final entram moças e mancebos vindos do monte, trazendo em cestos as suas mercadorias, que os compradores desprezam, mostrando-se mais interessados em galantear as vendedoras. Por fim, dirigem-se todos ao presépio, dançando e cantando em honra da Virgem Maria.

  

Mofina Mendes

 Representado ao rei D. João III, em 1534

O auto divide-se em duas partes, separadas por uma cena pastoril. Na primeira, assiste-se à Anunciação. A virgem Maria, rodeada das virtudes da Pobreza, Humildade, Fé e Prudência, recebe a visita do anjo que lhe anuncia ter sido escolhida para conceber o filho de Deus. Na segunda representa-se a Natividade. Entre ambas tem lugar uma espécie de entreacto entre camponeses e pastores. Um perdeu a burra, outro o gado que Mofina Mendes, a guardadora, descuidou. Ainda assim, paga-lhe o serviço com um pote de azeite, que lhe poderá vender e arrecadar o dinheiro. Imediatamente, Mofina Mendes fantasia que com o dinheiro da venda do azeite poderá comprar ovos de pata que, depois de chocados, darão patos, cuja venda renderá uma soma avultada, o que lhe permitirá efectuar um casamento como imaginou. Embebida nestes pensamentos, de contente bailar vertiginosamente com o pote à cabeça, que acaba por cair e o azeite derramar-se, ilustrando o provérbio «quem tudo quer tudo perde». Entram outros pastores e todos se deitam a dormir. Segue-se a segunda parte, sobre o Natividade. A virgem, agora já na companhia de S. José, dá à luz o menino Jesus, colocando-o num berço, que as virtudes embalam. O Anjo acorda os pastores, que se dirigem ao presépio para adorar o recém-nascido.

  

Pastoril castelhano

 Representado na noite de Natal de 1502, a pedido da rainha D. Leonor.

Dois pastores dialogam, revelando naturezas distintas,, um inclinado à vida solitária e contemplativa, o outro repreendendo-o por manifestar essa índole. Acercam-se outros pastores e todos conversam sobre a vida quotidiana até adormecerem. Desperta-os um anjo que lhes anuncia o nascimento de Cristo. Dirigem-se para o presépio, para onde levam ofertas com que presenteiam o recém-nascido, com canto e baile.

  

Pastoril português

 Representado em Évora ao rei D. João III, no Natal de 1523.

Um lavrador que casou por amor, temendo ser deserdado desloca-se a Évora onde a corte se encontra, a fim de esclarecer a dúvida. Gil Vicente, sabendo disso, fê-lo apresentar o auto que se segue, numa espécie de prólogo. A acção trata dos amores desencontrados entre três pares de pastores, não sendo nenhum dos pares constituído por um amor correspondido, preferindo cada elemento do par um elemento de outro par. Assiste-se a um jogo de atracção e rejeição na tentativa de criação de novos pares compostos de acordo com os desejos sentimentais de cada elemento. Quando tudo parece terminar em separação geral, surge uma nova pastora que conta ter presenciado uma aparição da Virgem Maria com o menino Jesus, que lhe comunicou que todos os clérigos mulherengos deveriam ser castigados. Traz consigo um feixe de lenha onde escondeu uma imagem de Nossa Senhora, que ficara no lugar da aparição. Descoberta a imagem, é adorada em oração e cânticos por quatro clérigos, que a pastora foi chamar.

  

Quatro Tempos

 Representado no Natal, na capela de São Miguel no Paço da Alcáçova, em Lisboa, ao rei D. Manuel por mandado da rainha D. Leonor, sua irmã. Não se indica o ano da sua representação, que terá acontecido por volta de 1510.

Um arcanjo e um serafim, acompanhados de dois anjos, adoram o presépio, celebrando a nova era. Desfilam as quatro estações (tempos) do ano, representadas alegoricamente, aludindo aos efeitos que cada uma produz na natureza, até que se encontram e reúnem. A eles junta-se Júpiter, que anuncia o fim do mundo antigo, e dirigem-se todos para o presépio. Em vez das tradicionais ofertas com que os pastores presenteiam o recém nascido, é agora oferecido o universo: os astros e a natureza da Terra. Por fim, entra o David, o rei pastor, que tem para oferecer em sacrifício o espírito atribulado e o coração contrito, parafraseando salmos e cânticos bíblicos.

  

Reis Magos

 Encomenda da rainha D. Leonor para o Dia de Reis de 1503. O autor desculpa-se da brevidade do auto por ter tido pouco tempo para o compor.

No percurso para Belém, um pastor perde-se, acabando por encontrar um outro que o acompanhará ao presépio onde nasceu Jesus. O caminho é-lhes indicado por um ermitão que os esclarece sobre o significado do nascimento de Cristo. Junta-se-lhes um cavaleiro que se desviara da rota indicada por uma estrela que seguia em companhia dos reis magos. Por fim surgem os três reis magos, que cantam um vilancete antes de entregarem as ofertas ao recém-nascido.

  

São Martinho

 Representado à rainha D. Leonor na igreja de Nossa Senhora do Pópulo das Caldas da Rainha, na procissão do Corpo de Deus de 1504.

Trata-se do exemplo da caridade protagonizado por São Martinho que, não tendo outra esmola para dar a um pobre que o interpela, com ele reparte a capa traz.

  

Sibila Cassandra

 Representado à rainha D. Leonor, no mosteiro de Xabregas, ou Madre de Deus, no Natal. Embora não explicitado, tem-se apontado o ano de 1513 para a sua primeira representação.

Transposto para o universo pastoril de Quinhentos, o auto encena personagens do Antigo Testamento e da mitologia da Antiguidade. Cassandra manifesta a sua decisão de não casar por considerar-se destinada a dar à luz o filho de Deus conservando-se virgem. Instada a pelos profetas e sibilas a casar-se com Salomão, Cassandra mantém firme na sua escolha do celibato explicando-lhes a razão da sua atitude. Todos tentam demovê-la revelando os sinais bíblicos da escolhida para mãe de Cristo, até que uma cortina se abre e se mostra o presépio, para onde se dirigem em adoração. Cassandra reconhece finalmente o seu erro e junta-se à oração à Virgem e ao Menino Jesus, terminando o auto com uma cantiga composta integralmente por Gil Vicente.

  

FARSAS

 Quotidiano e sátira, organizados em jogos entre engano e verdade, são os ingredientes principais na composição da farsa. Os motivos que representam são de sempre, e, por isso, continuamente encenados. A par das personagens-tipo, mais ou menos comuns a todos os autores da época, surgem outras que se vão modelando no desenrolar de ações originais que se desenvolvem na sequência de situações narrativas de grande eficácia cénica e dramatúrgica (Inês Pereira e Auto da Índia) ou, num modelo cénico e narrativo diverso, o desfile de uma sucessão de números (Juiz da Beira e Clérigo da Beira). A representação da realidade que as farsas promovem mostra uma atualidade familiar aos espectadores, que por vezes chegam a ser nomeados nas peças a que assistem. A conjugação de entretenimento e denúncia em tom de caricatura e riso é o suporte das farsas que recorrentemente são chamadas aos palcos para ressaltar os defeitos do mundo e dos seus protagonistas.

  

Almocreves

 Representada em Coimbra, em 1526, ao rei D. João III.

Um fidalgo pretensioso mas de pouca renda aparenta algum fausto. Desfilam um a um credores que exigem pagamento das dívidas acumuladas. O capelão queixa-se de não ter os honorários satisfeitos, contrapondo o fidalgo com a honra que é ser capelão dele, mesmo incompetente como ele julga o clérigo. Um ourives vem reclamar o pagamento de um saleiro que fabricou havia três anos; mais uma vez, o fidalgo alega com a péssima manufactura, adiando o pagamento. Em seguida, surge na serra um almocreve que transporta alguns bens do fidalgo. No caminho encontra outro almocreve. Ambos falam das respectivas vidas e dos serviços que prestam a fidalgos, que consideram maus clientes. Despedem-se, seguindo cada um seu caminho, continuando o primeiro para casa do Fidalgo. Ao chegar, reclama o pagamento do frete, mas o fidalgo remete-o para o seu azemel, que se encontra fora do reino, tendo, portanto, o almocreve que regressar muito mais tarde, partindo sem o pagamento do transporte. Por fim, o fidalgo recebe a visita de outro fidalgo a quem mente sobre a grande despesa que acabara de fazer com serviços mal prestados. Discorrem ambos sobre o amor, declarando-se o primeiro partidário do amor interesseiro, repreendendo-o o segundo por isso.

  

Auto da Índia

 Representado em Almada à rainha D. Leonor, em 1509.

Uma mulher cujo marido está prestes a partir para a Índia lamenta-se perante a possibilidade de a armada, e consequentemente o marido, não seguir viagem. Assegurada pela criada de que afinal já zarparam, alegra-se de imediato. Visitam-na dois amantes, um castelhano fanfarrão que lhe fala da rua com ela marca encontro para mais tarde, e um português, escudeiro, bem falante, mas sem dinheiro, que ela recebe em casa. À hora combinada regressa o castelhano que acaba por ver novamente adiado o encontro amoroso. Com o aproximar da manhã, a mulher despede o escudeiro, com receio de ser visto de dia a sair de sua casa. Três anos mais tarde regressa o marido, sem ter alcançado coma viagem à Índia a riqueza que imaginara. A mulher acusa-o de certamente lhe ter sido infiel naquelas paragens, declarando, falsamente, a solidão e tristeza em que ficara à espera do regresso da armada.

  

Auto da Festa

 O texto não se encontra na Compilação de todalas obras de Gil Vicente. Chegou até aos dias de hoje num folheto folto, de que se conhece apenas um exemplar. Possivelnente representado deois de 1526 em casa de um nobre.

Entra a Verdade que se dirige ao dono da casa onde o auto se representa, a quem reconhece ser o último baluarte da verdade em Portugal, convertido em reino de mentira e corrupção. Depois de se sentar, a figura assiste a um desfile de personagens que protagonizam pequenos episódios sem aparente ligação entre si. O primeiro a entrar é um Vilão que vem tratar de um processo judicial. Cometeu adultério com a mulher do juiz da sua aldeia e o magistrado quer vingar-se c prendê-lo. Segue-se o número de umas ciganas que entram cantando, para ler a sina a alguns fidalgos e damas da assistência. A sua saída dá lugar à entrada de um Parvo que dialoga primeiro com a Verdade e depois com um Vilão, num trecho humorístico que se repete na tragicomédia Templo de Apolo, onde se rpoclama a nacionalidade portuguesa de Deus e de toda a sagrada família. Entra por fim uma Velha, a mãe do parvo, que se julga ainda em condições de atrair noivo jovem para segundas núpcias, confessando que já rejeitara o próprio Gil Vicente por ser velho e barrigudo. Sai-lhe ao encontro um Rascão que, para divertir-se, diz querer casar-se com ela, sendo, no entanto, necessário uma dispensa papal pois suspeita que são parentes. Parte a Velha em busca do documento, aproveitando o Rascão para fugir. Regressam o Vilão da demanda maldizendo a aplicação da justiça em Portugal, e a Velha com a bula do Núncio Papal. Não encontrando o Rascão, propõe casamento ao Vilão, que a não rejeita. Vai buscar um pastor e três pastoras para a boda. No final todos dançam, pedindo à Verdade que se lhes junte, ao que ela acede.

  

Auto dos Físicos

 Desconhecem-se as circunstâncias da primeira representação.

Um clérigo acha-se doente sem que se consiga diagnosticar a moléstia de que sofre. Depois de uma comadre que o serve lhe receitar um repositório de remédios populares, são chamados quatro médicos que prescrevem tratamentos que julgam adequados à enfermidade de que suspeitam, sem, no entanto, acertar nem na doença nem na cura. Adivinhando-se perto da morte, o clérigo manda chamar um padre confessor a quem descobre o mal de que padece: encontra-se há dois anos perdido de amores por uma jovem que o rejeita, alimentando as esperanças de ser correspondido, com a cumplicidade do seu moço criado.

  

Ciganas

 Representado em Évora ao rei D. João III, em 1521 (?)

No final de um serão da corte, quatro ciganos e quatro ciganas irrompem por entre os espectadores, pedindo esmola de qualquer tipo. Depois de cantarem e de bailarem, numa língua marcada por traços andaluzes e num registo encomiástico, os ciganos propõem aos cortesãos a compra de cavalos e as mulheres lêem a sina às damas, profetizando-lhes felicidade no amor e no casamento.

  

Clérigo da Beira

 Representada em Almeirim, em 1526, ao rei D. João III.

Na véspera de Natal, na Beira, um clérigo e seu filho partem para a caça de coelhos, rezando as matinas, em tom paródico. Encontram no caminho o filho simplório de um lavrador, que leva consigo um cesto com fruta, dois capões e uma lebre, que vai vender à feira. Despedem-se, ficando o camponês só. Entram dois moços do paço que lhe roubam toda a mercadoria. No regresso à aldeia volta a encontrar o clérigo a quem conta o episódio. O clérigo promete ironicamente defendê-lo da ira do pai. De novo só, o jovem lavrador encontra um negro a quem também conta o sucedido. Decide ir banhar-se no rio, escondendo o chapeirão, o cinto e a bolsa numa moita, sem suspeitar que o negro o espia, esperando a oportunidade de roubar as coisas. Ao sair do rio, o moço vê-se novamente espoliado. Surge por fim uma velha com uma moça endemoninhada pela boca da qual fala um espírito, Pedr’Eanes que, invocado pela velha, adivinha quem foram os ladrões que roubaram o lavrador. Regressam os dois moços do paço, que reconhecem o poder o espírito e rogam-lhe faça o horóscopo de diversas pessoas da corte, que assistem à farsa, com que termina a farsa.

 

 Fama

 Representada em Lisboa, em Santos-o-Velho, em 1510, ao rei D. Manuel por iniciativa da rainha D. Leonor, sua irmã.

Um «mocinho da Beira», representando a Fama portuguesa, guarda patos e é cortejada por três pretendentes estrangeiros que desejam levá-la consigo, um castelhano, um italiano e um francês, que se lhe dirigem cada um na sua língua. A pastora, consciente da sua qualidade, rejeita-os a todos, enaltecendo o valor de Portugal na difusão da fé cristã e engrandecimento do império. No final, as alegorias da Fé e da Fortaleza coroam-na de louros e transportam-na num carro triunfal ao som de música.

  

Fadas

 Representada no paço ao rei D. Manuel, antes de 1506 (?)

Indignada com o facto de ter sido decretada uma lei que proíbe e penaliza a feitiçaria, uma feiticeira vem queixar-se ao rei tencionando provar-lhe que o seu ofício é muito necessário, sendo até procurado pelas pessoas da corte, de que dá exemplos. Para tal, através de esconjuros faz surgir um diabo que cumpra as suas ordens, No entanto o diabo fala em picardo e não se entendem. Assim, quando a velha lhe ordena que lhe traga umas fadas marinhas ele não percebe e em vez delas traz do Inferno uns frades, que ali penavam. Um deles pregará um sermão paródico sobre o poder do amor, dirigido às damas, que expõe incidentes amorosos sucedidos na corte. Por fim, o diabo traz as sereias que fadam o rei e a rainha, profetizando-lhes felicidade e gloria. O serão termina com um jogo de sortes. Após entregarem aos membros da família real os escritos onde se encontram as suas sortes, exemplificadas em planetas, as fadas distribuem por todos os espectadores as sortes ventureiras de cada um, sendo as dos homens definidas por animais e as das mulheres por aves.

 

 Inês Pereira

 Representada no Convento de Tomar ao rei D. João III, em 1523.

A farsa ilustra o exemplo comum «Mais quero asno que me leve do que cavalo que me derrube». Inês Pereira quer casar com um homem instruído, bem falante, que a galanteie e lhe proporcione uma vida agradável. No entanto, uma alcoviteira propõe-lhe para marido um lavrador abastado, que Inês desconfia ser um labrego idiota. Quando Pero Marques, o noivo proposto, a vai visitar, Inês confirma a sua suspeita e rejeita-o, contra o parecer da mãe. Agora são dois judeus casamenteiros que lhe indicam um noivo que preenche os requisitos exigidos por Inês Pereira. Trata-se de um escudeiro que logo no primeiro encontro conquista a jovem. Casam de imediato, com a bênção da mãe. No entanto, logo após o casamento, o escudeiro revela-se de uma índole bem diversa: tirano e prepotente, deixando Inês encerrada em casa, vigiada por um criado, quando parte para o Arzila. Inês, resignada reconhece o erro da escolha. Oportunamente chega a notícia da morte do marido em combate. Inês regozija-se com o seu estado de viúva e aceita agora para marido o noivo rico e imbecil que a alcoviteira lhe propusera. Depois de casados, Inês reata relações com um antigo pretendente, agora ermitão, pedindo ao novo marido que a leve ao encontro do amante, o que Pero Marques faz levando-a às costas, carregando, igualmente, umas lousas que ela recolhe no caminho, e ilustrando, assim, o provérbio que deu origem à peça.

 

 Juiz da Beira

 Representada ao rei D. João III, em Almeirim, em 1525.

O protagonista é Pero Marques, segundo marido de Inês Pereira. Depois de casados, foi nomeado Juiz nas terras da Beira, para onde o casal foi viver. A fama das suas audiências disparatadas chegou ao rei que o compele a vir mostrar na corte como julga os casos. Dando-se mal com assentos sofisticados, Pero Marques dispensa a cadeira que lhe é oferecida para dar audiências, preferindo um banco, ou tripeça, de menos dignidade mas que lhe é mais familiar. Começam os julgamentos. Em primeiro lugar surge uma alcoviteira que denuncia a violação da filha numa seara de trigo. No julgamento que faz, Pero Marques lança a suspeita de conivência da jovem, adiando a sentença até que o trigo seja mondado, indo então todos verificar se o cereal está revolvido, com sinais de luta. A segunda audiência é a um sapateiro cristão-novo que acusa a mesma alcoviteira de lhe ter desencaminhado a filha. A sentença é proferida a favor da proxeneta por exercer um ofício de grande utilidade, laçando a suspeita de esta apenas ter satisfeito as predisposições da filha do sapateiro. O terceiro queixoso é um escudeiro que culpa a mesma alcoviteira de lhe extorquido dinheiro para pagar os serviços amorosos de uma moura que nunca se concretizaram. A sentença é novamente a favor da alcoviteira, sendo o escudeiro censurado por tentar consumar amor venal. O mesmo escudeiro acusa o seu próprio criado de o ter deixado sem lhe restituir o vestuário de que o provera. O juiz considera que o ainda assim o escudeiro deve indemnizar o moço e até passar ele a servi-lo, numa inversão de papéis. Por fim vêm à audiência quatro irmãos, um preguiçoso, um bailador, um namorado e um brigão,  que disputam a posse de um burro herdado do pai. Decide o juiz que o burro seja citado para depor.

 

 Lusitânia

 Representado em Lisboa em 1532, ao rei D. João III

A farsa conta com uma espécie prólogo em que se representa  o quotidiano de uma família judaica: a filha, dois filhos ainda crianças, a mãe e o pai. Mãe e filha encontram-se ocupadas na lida da casa, a mãe no andar de cima e a filha no piso térreo. Surge um Cortesão que, da rua, dirige galanteios à filha, que se faz desentendida. Chega o pai, alfaiate, que saíra de manhã. Senta-se a coser, na companhia do filho, e ordena as tarefas domésticas. Vem visitá-lo um outro judeu que informa a iminente chegada do rei á cidade, sendo necessário preparar os festejos para a entrada real. O Senado determinou que os judeus representassem uma peça de teatro. Confessando-se ignorantes na matéria, decidem ir ver um auto que Gil Vicente se encontra a representar, para ver como se faz.. Trata-se do Auto da Lusitânia. Na Serra de Sintra vivia uma ninfa com a filha, Lusitânia, que Júpiter gerara nela. `serra chega um caçador, Portugal, que se enamora imediatamente de Lusitânia. Na perspectiva de ficar sem a filha, A mãe morre de desgosto. No entanto, o deus destinara à filha um outro noivo, Mercúrio, que se revela incapaz para o casamento. perturbada por não querer desobedecer ao pai, Lusitânia invoca as deusas da mitologia greco-romana, que a vêm consolar. Acompanham-nas uns seus capelães, assistem a um episódio em que estes apontam num caderno o diálogo travado por duas figuras alegóricas, Todo-o-Mundo e Ninguém, que sintetiza o estado do mundo. Portugal regressa da caça e Mercúrio reconhece que, ao contrário de si próprio, aquele é o marido adequado para Lusitânia, terminando a farsa em festa.

 

 

Quem tem farelos?

 Representado em Lisboa em 15(??).
Dois moços de esporas, um português e outro espanhol, procuram farelos para alimentar as montadas dos respectivos amos, escudeiros. Conversam sobre cada um patrões e o português convida o companheiro a segui-lo e verificar com os próprios olhos o comportamento ridículo do escudeiro pelintra e enamorado, que se encontra em casa lendo em voz alta composições amorosas da sua autoria. Com a chegada do criado, decide ir fazer uma serenada à sua amada, que o ouve da janela. O serão musical é acidentado, constantemente interrompido por cães, gatos, galos e, finalmente, a mãe da jovem que lhe roga uma praga. Frustrado, parte, ficando a mãe a censurar a filha por ter um comportamento pouco sisudo. A jovem enfrenta-a, respondendo que quer alegria e prazer na vida.

  

Velho da Horta

 Representado ao rei D. Manuel, em 1512
Um velho está na sua horta quando surge uma jovem que vem em busca de ervas aromáticas para cozinhar. O velho corteja-a mas ela resiste. A mulher manda-o chamar para jantar, mas ele deixa-se ficar na horta, entoando composições de amor. Uma  alcoviteira, adivinhando um potencial cliente, acerca-se e oferece os seus serviços, conseguindo extorqui-lhe avultadas somas de dinheiro. Contudo, as forças da lei acabam por prendê-la e castigá-la, ficando o velho sem dinheiro e sem namorada, pois a moça já casara com noivo jovem.

  

COMÉDIAS E TRAGICOMÉDIAS

 

 As comédias formam o conjunto mais pequeno de peças de Gil Vicente – apenas quatro – contando-se, também, elas entre as peças menos representadas de todo o repertório do autor. Conhecedor da arte cómica, Gil Vicente sabe que todas as comédias começam mal e acabam bem. E assim acontece nas quatro que compôs: a dor inicial dá lugar ao amor e alegria finais, celebrando a harmonia do mundo, que a união dos pares amorosos restaura.
Originalmente compostas para celebrar festas da corte como casamentos e nascimentos, as tragicomédias, de que se conhecem dez, constituíram no tempo de Gil Vicente espetáculos de grande fausto, integrando números musicais aparatosos. Nelas se representam tempestades marítimas, viagens a mundos longínquos da cavalaria, forjas magníficas capazes de modelar o mundo, filtros mágicos, que adquirem significados particulares no universo alegórico que fabricam.
Apesar de ser um teatro circunstancial, estas peças têm despertado o interesse de encenadores, sobretudo a partir das últimas décadas do século xx. Por um lado, a estrutura dramatúrgica de algumas delas, como a de D. Duardos, aproxima-se bastante do que virá a ser o teatro dos séculos seguintes; por outro, os dispositivos cénicos que algumas exigem colocam desafios que encenadores, cenógrafos, figurinistas e músicos (re)criam para atores darem vida às personagens que frequentemente habitam mundos de fantasia e estranhos à realidade imediata.

 

Amadis

Tragicomédia representada ao rei D. João III em1533, em Évora.

É uma adaptação de m episódio do romance de cavalaria homónimo. Amadis, cavaleiro andante, filho do rei Perón de Gaula, chega à corte do rei Lisuarte incógnito, sob o nome de Donzel del Mar, em busca de aventuras que lhe confiram fama. Oriana, filha do rei Lisuarte, imediatamente se apaixona por ele. Encontram-se de noite no jardim, onde Amadis revela a sua identidade e se declara em modos tão excessivos que Oriana se sente ofendida e o rejeita. Um anão de Amadis, queixoso do mal-viver que o amo lhe dá, chega à corte de Lisuarte e inventa que Amadis, despeitado, se prendeu de amores por Briolanja, que conheceu nas suas aventuras. Ressentida, Oriana escreve a Amadis uma carta de ruptura. Ignorante da intriga, Amadis, desesperançado, faz-se eremita sob o nome Beltenebrós. Conhecedora da atitude de Amadis, Oriana volta a escrever-lhe, desta vez propondo a reconciliação. Após ler a carta, esquecidas as desavenças, Amadis deixa o hábito e torna à sua condição de cavaleiro

 

Cortes de Júpiter

Tragicomédia representada a D. Manuel I em Lisboa, em1521, na partida da infanta D. Beatriz para Turim, onde ia casar-se com o duque Carlos III de Sabóia.

Deus envia a Providência a Júpiter, “rei dos elementos”, para que reúna cortes com o propósito de tornar os mares favoráveis a uma navegação serena. Júpiter ordena aos Quatro Ventos, ao Sol, à Lua, a Vénus e a Marte que protejam a frota na sua viagem até Nice. Reunidos em cortes, decidem estes deuses que alguns cortesãos e habitantes de Lisboa se hão-de metamorfosear em peixes para escoltar os navios em alto mar até ao estreito de Gibraltar. A partir daí a protecção é assegurada por uma moura encantada, que apresenta as suas dádivas à nova duquesa: um anel, um dedal e uma espada que hão-de favorecer a noiva.

 

Divisa [da cidade] de Coimbra

Comédia representada em 1527, em Coimbra, ao rei D. João III

A comédia é uma explicação dos elementos representados na divisa de Coimbra: um dragão, um leão, um cálice e uma princesa. A acção situa-se na serra da Estrela, num tempo antigo. Fugidos da miséria que assolava a sua terra, os irmãos Celipôncio e Liberata refugiam-se na floresta, perto de um castelo onde o selvagem Monderigón mantém encerrada a princesa Colimena, filha do rei da Andaluzia, e quatro damas, depois de prender Melidónio, irmão da princesa. Quando Celipôncio vai caçar, Liberata repousa num lugar escondido, e, para distrair-se, canta. O selvagem escuta a voz e segue-a até encontrar Liberata, por quem se apaixona, mas a jovem impõe-lhe a ordem de não tornar a vê-la. Por sua vez, Celipôncio enamora-se de Colimena, a quem avista numa varanda do castelo. Não querendo infringir a determinação de Liberata, Monderigón envia Melidónio como seu mensageiro, que a avisa da crueldade do selvagem. O selvagem pretende matar Celipôncio para raptar Liberata. Porém, Celipôncio, com a ajuda de um dragão e de um leão que se lhe afeiçoaram enquanto caçava, consegue matar Monderigón e libertar a princesa Colimena, as damas e o irmão.

A comédia termina com a explicação fantasiosa da etimologia dos nomes quer da toponímia local quer de algumas famílias: Mondego deriva de Monderigón; Coimbra de Colimena; Melidónio fundou a vila da Lousão, dando origem aos Melos; as quatro damas de Colimena – Belicrasta, Selivenda, Sosidéria e Perigéria – deram origem respectivamente aos Castros, Silvas, Silveiras e Pereiras.

 

Dom Duardos

Tragicomédia representada ao rei D. João III. Não se indica o ano da sua representação, que terá acontecido entre 13 de Dezembro de 1521–17 de Novembro de 1525

Trata-se da adaptação de um episódio do romance de cavalaria Primaleón. Dom Duardos, príncipe de Inglaterra, apaixona-se por Flérida, filha de Palmeirim, imperador de Constantinopla, a cuja corte veio ter na busca de aventuras. Prende-se de amores pela jovem quando esta impede o duelo para o qual o príncipe desafiara Primaleão, um cavaleiro da corte imperial. D. Duardos, então, encobre a sua verdadeira identidade fazendo-se passar por jardineiro para poder aproximar-se de Flérida, trabalhando na horta do palácio. A princesa começa a render-se aos encantos do rústico, acabando por ceder ao amor que sente por ele. Dom Duardos revela a sua verdadeira identidade e partem para Inglaterra.

 

Floresta de enganos

Comédia representada em 1536 a D. João III, em Évora

Tal como o título indica, encena-se uma miscelânea de enganos, assente no tema do enganador enganado. Após um prólogo em que dialogam um filósofo e um parvo que traz atado ao pé, começa a comédia por um número farsesco em que um mercador desonesto, que vive da usura, compra a uma pobre viúva um título de dívida por valor muito inferior ao nominal. Na verdade, a viúva é um escudeiro disfarçado e o documento é falso, ficando o mercador enganado. Segue-se o enredo da comédia. Cupido, deus do amor, tenta cativar a bela Grata Célia, filha de Telebano, rei da Tessália, que a tem muito vigiada. Para isso convence Apolo que a princesa tem um comportamento aviltante contra os deuses que, irados, irão castigar a cidade incendiando-a, fazendo arder o próprio templo de Apolo. A única solução é isolar Grata Célia na Serra Minea, prendendo-a com uma corrente. Apolo engana o rei Telebano, levando-o a executar o plano de Cupido. Na ausência do rei é o velho Doutor Justiça Maior que fica no seu lugar. Tomado de amores serôdios por uma moça, o juiz deixa-se enganar por ela que, com a promessa de retribuir o amor, o recebe no moinho onde o veste de negra e o obriga a peneirar farinha. Na Serra Minea, Cupido aproxima-se de Grata Célia, que o repele, não sem antes o ter enganado, conseguindo que ele a soltasse e se prendesse a si próprio. O deus do amor persuade um pastor a trocar de lugar com ele e volta a proclamar o seu amor a Grata Célia. A princesa volta a enganá-lo exigindo-lhe nova prisão por pouco tempo, o suficiente para conquistá-la, ao que o deus acede. O acaso fez chegar ali um príncipe da Grécia, que se apaixona por ela, e Cupido é novamente enganado, pois Grata Célia casa com o príncipe. No final, surge a Ventura que os un

 

Frágua

Tragicomédia representada em 1525, em Évora, para assinalar o casamento entre D. João III e D. Catarina.

Trata-se de uma alegoria em duas partes. Na primeira, um Peregrino e um Romeiro comentam a conquista de um castelo simbolizando a noiva (D. Catarina) por um grande rei (D. João III), que tem por capitão Cupido. Entra Vénus em busca do filho, Cupido, que julga perdido. Ao sabê-lo ao serviço do rei de Portugal, declara-se ditosa. Surge um Negro que ao ver a deusa do amor se enamora dela, declarando-se-lhe na convencionada «língua de negro», que ela diz não entender. Na segunda parte são colocados em cena um castelo, tendo Cupido por capitão, e uma forja da responsabilidade Mercúrio, acompanhado por quatro galãs caldeireiros figurados em planetas, que trazem martelos, e por quatro serranas figuradas em gozos de amor, que trazem tenazes. Mercúrio anuncia o poder transformador da sua forja e convida a nela entrar quem quiser ser remodelado. O primeiro freguês é o Negro, que deseja ser branco. Entra na frágua e sai de lá branco, mas falando ainda na sua «língua de negro», concluindo ele que assim a nova cor da pele não lhe serve. A segunda cliente é a Justiça, que se declara muito necessitada de renovação, pois tem a balança partida e a vara torta. Na forja despojam-na dos atributos de corrupção que levava consigo, saindo de lá « muito fermosa e dereita». O terceiro candidato a reforma é um Frade que deseja ser um fidalgo galante. Mercúrio não o atende sem antes o Frade ir buscar uma provisão do seu superior. Por fim entra na frágua, de onde sai refundido.

 

Nau de amores

Tragicomédia representada em Lisboa em 1527, ao Rei D. João III e à rainha D. Catarina, na entrada do casal real na cidade, após longa ausência.

Lisboa faz o elogio do rei e da rainha, que regressam à cidade. No final do discurso entra o Príncipe da Normandia que, sabendo das excelências da nau da divisa de Lisboa, a pede emprestada à cidade para navegar até à ilha da Ventura em busca da Fama. Ao ser-lhe negado o pedido, o Príncipe solicita que Lisboa pelo menos consinta que ele mande construir uma Nau de Amores na Ribeira da cidade. Lisboa acede ao pedido e entra em cena uma nau que será acabada de consertar pelos fidalgos que acompanham o príncipe. Prestes para a partida, o príncipe nomeia por capitão da nau o Amor e manda apregoar a viagem para que embarquem os passageiros que o desejem seguir. Serão sete: um frade doido, um pastor castelhano, um negro do Benim, um velho, dois fidalgos portugueses e um parvo, todos maltratados pelo Amor, que partirão em busca de remédio.

 

Romagem dos Agravados

Tragicomédia representada em Évora, em 1533, para celebrar o nascimento do infante D. Filipe, filho do rei D. João III e da rainha D. Catarina.

Perante Frei Paço desfila uma série de personagens descontentes com a vida. Vêm, aos pares, queixar-se à figura alegórica do clero e do paço, apresentando os motivos por que se sentem lesados e requerendo remédio para a sua condição. O primeiro par é um lavrador, acompanhado do filho, que se queixa de Deus porque os campos produzem pouco; o segundo é constituído por dois fidalgos infelizes no amor; o terceiro por duas vendedeiras que se queixam de ter sido enganadas por um pelintra que se fez passar por moço da câmara e assim conseguiu levar-lhes a sobrinha com um bom dote; o quarto por dois ambiciosos, um servidor do paço que deseja ser conde e um frade que pretende ser bispo, nem que seja de um pequeno lugarejo; o quinto é um camponês com a filha, uma camponesa que o pai quer colocar no paço para assim remediar a pobreza em que se encontra; o sexto é formado por duas freiras, que se queixam da clausura e da penitência a que são obrigadas; por último vêm duas pastoras que se lamentam por terem de sujeitar-se à vontade paterna no que diz respeito à escolha de noivos. A sentença de Frei Paço é a de que cada um deve contentar-se com o destino que lhe coube, propondo um baile em honra do infante recém-nascido.

 

Rubena

Comédia representada em 1521, ao príncipe D. João, futuro rei D. João III

A comédia compõe-se de três partes. Na primeira, que se desenrola em Castela, Rubena, filha de um abade, engravida de um jovem clérigo Tenta disfarçar a gravidez mas acaba por confessar-se a uma parteira, que, com a ajuda de uma feiticeira e de quatro diabos esconjurados, preparam o parto longe daquelas terras. No começo da segunda parte, os diabos entregam Cismena, que Rubena dera à luz, à feiticeira, contando que mãe ficara às portas da morte. Quatro fadas, vindas a mando da feiticeira, predizem-lhe um futuro próspero em Creta, alcançado, contudo após etapas de sofrimento na infância. A menina será criada por uma ama, tornando-se pastora até à idade de se cumprir o fado e partir para Creta. A terceira parte tem lugar já em Creta: Cismena, com quinze anos, perdeu a mãe adoptiva, uma mulher rica  que a perfilhara e a instituíra sua herdeira. A sua riqueza e formosura atraem vários pretendentes, que a jovem rejeita, acabando por casar-se com o pajem de um deles, que, na verdade, é um príncipe da Síria disfarçado. Cumpre-se o destino e a pastora torna-se princesa.

 Serra da Estrela

 Tragicomédia representada em Coimbra em 1527 ao nascimento da infanta D. Maria, filha de D. João III e de D. Catarina.

Após um discurso laudatório da família real e da ocasião, proferido pela figura alegórica da Serra da Estrela, interrompida por um parvo, entram em cena três pastores e três pastoras que protagonizam uma história jocosa de amores desencontrados. Os seis pastores encontram-se reunidos em três pares que não sentem afecto verdadeiro entre si, desejando, na verdade, casar-se com um serrano ou serrana de outro par. A constituição final dos casais é ditada por um ermitão que tira à sorte com que pastora cada pastor deve casar, acabando cada um por reconhecer que realmente o par que lhe calhou é o adequado. A peça termina com um novo discurso da Serra da Estrela, desta vez encomiástico, sobre os produtos da região, que os pastores oferecem à infanta recém-nascida.

 Templo de Apolo

 Tragicomédia representada em 1526, para celebrar o casamento da infanta D. Isabel, filha de D. Manuel I, e de Carlos V, imperador da Alemanha e rei de Espanha.

É uma tragicomédia alegórica. Num templo dedicado a Apolo, o deus encontra-se sentado no altar para receber os romeiros e romeiras que ali se dirigem. Os primeiros figuram os atributos do imperador (o Mundo, o Poderoso Vencimento, o Ceptro Omnipotente e o Tempo Glorioso) e as segundas as qualidades da infanta imperatriz (a Flor da Gentileza, a Virtuosa Fama, a Prudente Gravidade e a Honesta Sabedoria). Todos começam por ser recebidos por um Porteiro, a quem se identificam em discursos encomiásticos dos recém-casados, e pedem a Apolo que lhes dê mais poderes e reforme o mundo da maneira que lhes convém. Após o desfile das figuras alegóricas, entra um vilão português que protagoniza um diálogo humorístico com o Porteiro, protestando que todas as figuras se expressem em castelhano – a língua utilizada por todas as personagens – quando é verdade sabida que «Deus é português». Este número cómico final encontra-se também no Auto da Festa.

 

 

Triunfos do Inverno e do Verão

 Tragicomédia representada em Lisboa em 1529 ao nascimento da infanta D. Isabel, filha de D. João III e de D. Catarina.

No prólogo, o autor lamenta o tempo de tristeza que se vive em contraste com a alegria de um passado recente, anunciando o programa da peça: primeiro o Triunfo do Inverno, a que se seguirá o Triunfo do Verão (Primavera). O primeiro é constituído por duas partes: na primeira parte um pastor, que encarna o Inverno na figura de selvagem e exalta o seu poder, assiste à representação da história de uma velha que ama um rapaz e tem de atravessar, descalça, a montanha nevada para se lhe juntar; na segunda, representa-se uma tempestade marítima que assola uma nau prestes a naufragar. A cena termina com nova intervenção do Inverno, que anuncia as sereias portadoras de bonança e canta um romance dirigido ao rei. Começa o Triunfo do Verão com a entrada em cena desta figura alegórica, representada por um jovem que canta o fim das geadas e a natureza verdejante. Junta-se-lhe a Serra de Sintra e ambos assistem a uma cena cómica entre um casal desavindo, ele ferreiro e ela forneira, que temem os efeitos do Estio que se aproxima. A peça termina com a entrada em cena de um príncipe que se faz acompanhar de quatro moças e quatro mancebos, trazendo um jardim das virtudes com que vão presentear o rei.

  

Viúvo

 Comédia representada em 1514, tendo assistido o príncipe D. João, futuro rei.

A acção passa-se em Burgos. Um mercador viúvo lamenta a sua condição, chorando a mote da mulher virtuosa. Na sua pena, é consolado primeiro por um frade que critica o luto excessivo, e depois, em tom humorístico, por um seu compadre que de boa vontade trocaria de estado com ele, pois encontra-se casado com uma mulher insuportável. Também as duas filhas do viúvo recordam a mãe, modelo de perfeição. Chega à cidade um príncipe da Uxónia que se enamora das duas jovens. Para poder conviver com elas, disfarça-se de «trabalhador ignorante», sendo admitido ao serviço pelo pai viúvo. Fatalmente, ambas as moças se prendem de amores por ele. Incapaz de se decidir com qual das duas se casar, decidem pedir a D. João, que assistia à representação, que resolvesse a questão. A escolha recaiu na mais velha. Providencialmente surge um irmão do príncipe da Uxónia que casará com a mais nova.


Uma edição digital da obra encontra-se disponível em Teatro de Autores Portugueses do Século XVI, da responsabilidade do Centro de Estudos de Teatro.


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